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Tony Garcia

Entenda o escândalo na Activision Blizzard

Coluna ‘Game Designer Sincero’ aponta os motivos que estão a Blizzard de contorcer na chapa quente dos novos tempos
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Blizzard
Derretendo.
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Introdução

Não é de agora que a Activision Blizzard vem enfrentando problemas. A última expansão do World of Warcraft tem sido crítica de seus jogadores devido a uma série de péssimas decisões de design, bugs horrorosos e uma série de problemas de performance.

Somando problemas com títulos clássicos como o Diablo, tendo de uns anos para cá uma série de baixas, na empresa que era uma das mais queridas de todos os jogadores. Contudo semana passada uma bomba estourou nos reinos de Azeroth.

No dia 20 de julho, o Tribunal Superior de Los Angeles abriu um processo (depois de uma investigação de 2 anos) contra a empresa, devido a práticas de assédio sexual, desigualdade de salários e até mesmo comportamento inadequado, sofridos por suas funcionárias diante do corpo masculino da empresa.

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Nessa conta entram ainda episódios como piadas de cunho sexual (envolvendo até estupro), comportamento inadequado (de alguns funcionários passarem as mãos nos seios das funcionárias) e até o suicídio de uma colaboradora devido a um episódio de assédio muito pesado.

A notícia estourou na imprensa especializada gringa no ultimo dia 22 e analisamos desde então para entender realmente o que estava acontecendo. Vamos agora contar e esclarecer resumidamente toda esta treta e as suas possíveis consequências.

Os “Frat Boys” e a Cultura Sexista da Empresa

O termo “Frat Boy” aparece como sendo um dos principais pontos em toda esta história e parecer nortear o comportamento do corpo masculino da empresa. Este termo vem das famosas “fraternidades universitárias”, bem retrado no clássico Clube dos Cafajetes, comédia de 1978.

REVIEW REVISITED: National Lampoon's Animal House (1978)
Um dia de trabalho na Blizzard?

Por “increça que parível” o comportamento dos funcionários da Blizzard era nos moldes destas fraternidades a nível corporativo. Chegar de ressaca no trabalho, fazer piadas sexistas com as mulheres da empresa, deixando todo o trabalho para elas (enquanto jogavam videogame), era prática de muitos funcionários masculinos de acordo com relatos apontados.

Em uma situação de total discriminação, uma funcionária extremamente competente na área de marketing, que gerou em suas campanhas de marketing mais faturamento do que seus equivalentes masculinos, relatou ter sido mantida num cargo inferior, ganhando menos que os homens da sua área e tendo promoção negada.

No processo é afirmado que apesar desta mesma funcionária ter faturado e produzido mais (o dobro) que seus equivalentes masculinos, quem era chamado para as reuniões mensais ou semanais com o vice-presidente da empresa era um homem, não ela.

Outras situações descritas no processo, como discriminação, constrangimento e um ambiente altamente tóxico para as funcionárias da empresa, veio a tona com este processo, mostrando que e a coisa é muito pior do que se pensava. O ambiente geral da empresa (que era uma das mais queridas da comunidade de jogos), é um antro de babacas e de muita sujeira.

A Blizzard tentou colocar panos quentes na história, falando que muita coisa foi distorcida, mas um vídeo da Blizzcon de 2010 parece mostrar que onde há fumaça, há fogo. No Minuto 4:20 uma jogadora do WOW pergunta sobre a hipersexualização das personagens femininas no jogo. Confira abaixo o vídeo que está fritando a empresa:

Quem responde são duas figuras bem conhecidas na Blizzard: J. Allen Brack (esquerda) e Alex Afrasiabi (direita). A resposta de Allen Brack, indica que tudo isto que está acontecendo tem um fundo muito profundo de verdade e é muito mais antigo e complicado do que nós imaginamos.

A verdade que está chegando para nós, jogadores e fãs da Blizzard, é que tem um monte de caras muito babacas e escrotos que promovem uma cultura tóxica e totalmente condenável para as mulheres na corporação. A reação agora por parte da Blizzard, são comunicados pedindo desculpas, “vamos punir os culpados”, blá, blá, blá.

Para mim, tratava-se de uma coisa apenas para “inglês ver” e que iria cair no esquecimento daqui há algum tempo. No entanto, o cenário e os tempos são outros.

A Reação da Comunidade

A Guilda de World of Warcraft Fence Macabre, organizou um protesto que contou com jogadores tanto da Aliança quanto da Horda nos reinos Wyrmrest Accord e Moon Guard. Eles protestaram contra tudo isso que estava acontecendo, reunindo centenas de jogadores online simultaneamente.

“Nós, como clientes e membros dessa comunidade, viemos protestar contra o tratamento antiético dado às funcionárias da Activision Blizzard e exigimos mudanças transparentes e permanentes na empresa e nas suas marcas associadas”, dizia o convite (tradução livre).

A ação também arrecadou doações para a ONG Black Girls CODE, uma instituição que ensina programação para para jovens negras de 7 a 17 anos. O interessante é que muitos jogadores (inclusive quem está no jogo há mais de 16 anos) resolveram cancelar as sua contas, como forma de protesto.

A coisa não para por aí, diversos streamers/sites de WoW estão parando de falar sobre o jogo, como forma de forçar a Blizzard ter uma medida efetiva contra este tipo de situação. A verdade é que a Blizzard é um exemplo que acontece em muitas empresas de jogos e que ninguém fala.

O que vem depois? Uma pausa para reflexão

Os episódios lamentáveis vindos da Blizzard no que diz respeito ao seu ambiente de trabalho só mostram que a indústria de jogos ainda tem um ambiente tóxico, intolerante e machista. É inadmissível estas práticas, vindas de caras que considerávamos geniais, mas que no fundo são um bando de idiotas e babacas.

Empresas assim só entendem que fizeram algo muito errado “sentindo no bolso”, ou seja: perdendo rendimento em seus produtos, Isso não deveria ser assim. Na realidade este tipo de comportamento já deveria ter acabado há tempos. Mas há muito do que se fazer no que diz respeito a este tipo de padrão comportamental na indústria de games.

A Blizzard vai tomar um baque nesta história toda, vai realmente amargar mais um problema dos vários que vem sofrendo. Mas desta vez algo precisa ser feito! As pessoas responsáveis punidas de verdade. Não há mais espaço para isso na comunidade e na indústria de jogos.

Precisamos mudar esta postura babaca e doentia, criando um ambiente sadio e de respeito em nosso ambiente de trabalho. Os jogos precisam dar este exemplo. Precisam mostrar que uma indústria que é tão inovadora como a nossa, está antenada com a nova realidade do mundo. Não há mais espaço para isso!

Precisamos ser melhores como pessoas e indivíduos, não entes desprezíveis como estes.

PS: Eu estava pensando em voltar a jogar Wow, fui jogador por mais de 10 anos, mas depois dessa o encanto acabou.

Tony Garcia é Game Designer, Educador, Gamification Designer, Especialista em Manufatura Aditiva e em Tecnologias Educacionais.
Tem mais de 80 jogos desenvolvidos e trabalhou com mentoria em mais de 30 startups de jogos. Atuou em projetos de jogos educacionais e gamificação
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