A maioria das pessoas que eu conheci/conheço na área de desenvolvimento de jogos sempre tiveram como incentivo para seus projetos os grandes títulos de sua adolescência. Aqueles jogos que foram jogados em consoles, computadores ou em portáteis, nortearam o desejo de seguir na profissão de desenvolvedor de jogos e ter seu próprio estúdio. Muitos inclusive foram empurrados pela visão romântica do filme Indie Game The Movie, que na minha opinião prejudicou em muito a visão do negócio de game (isso é papo para um outro artigo).
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A partir do momento que na cabeça de muitas pessoas passa a ideia de “quero fazer um jogo”, começa uma jornada que em 90% dos casos vai acabar numa frustração e muita decepção. Fazer um jogo demanda tempo, conhecimento, muita disciplina e um planejamento para não morrer antes do tempo. Na maioria das situações as ideias de jogos morrem em vários estágios do processo, ou até mesmo antes de serem iniciados.
Romantismo?
Para exemplificar um “causo” sobre esta situação, certa vez fui fazer uma mentoria para uma startup de jogos. Era a primeira fase de um programa de aceleração e dai a 15 dias os responsáveis teriam que fazer uma apresentação do projeto. Ao começar a reunião com eles, deparei logo de cara com um grupo de pessoas sonhadoras, sem nenhum pé no chão e totalmente desorganizadas. Eles tinham a famosa “idéia”, mas na prática nada tinham.
Na hora me veio a frase na cabeça “Sua idéia não vale nada, o que vale é a execução” e sem perdão disparei contra eles uma série de orientações para tentar salvar o projeto. O resultado foi o seguinte: nada foi feito por eles, trocaram os pés pelas mãos. Foram eliminados.
Eu mesmo quando comecei a fazer jogos passei por este romantismo, mas a realidade de ter projetos fracassados, prejuízos, perda de clientes, me fizeram acordar para o “frio deserto do mundo real”. A partir daí e cerca de 100 jogos depois (feitos e entregues) comecei a ver que o pessoal que faz jogo na sua maioria não tem a mínima noção do seu negócio.
Eu fazia parte desse grupo romântico e foi durante muito tempo. Até que um dia eu falhei miseravelmente e isto me custou dinheiro, amigos e durante um tempo a saúde física e mental. Foi então que eu acordei. Ainda existe para muita gente o desejo de “fazer o jogo dos meus sonhos”! Eu quero ser o novo Kojima, quero ser o novo “God of War”, eu quero, eu quero… Dinheiro para que? Boletos, isso não existe!
O resultado na prática deste pensamento são os projetos que falham, profissionais que se frustram e a falta de um cenário sólido de desenvolvimento.
O que está faltando para o profissional de jogo?
Os anos passaram no Brasil e temos casos de sucesso na área de jogos como do estúdio Aquiris, a Behold Studios, A Player One, empresas formadas por jogadores e profissionais de jogos que começaram a enxergar e a entender uma coisa importante: jogo é negócio, tem que ser rentável e pagar as contas no final do mês. São empresas que hoje são importantes players no mercado e estão atuando firmemente em suas propostas.
Contudo eu vejo que falta para a grande maioria dos desenvolvedores de jogos uma visão mais empresarial e menos romântica. Enxergar a viabilidade de seu produto, a área que está atuando na indústria de jogos e se isso vai realmente pagar os seus gastos e gerar lucro.
Para fazer um contraponto, posso abrir espaço para aquele cara que quer fazer um jogo apenas como hobbie, ou seja para satisfazer uma vontade sua. Ele não depende daquilo para pagar as contas no final do mês. Está desenvolvendo seu jogo como algo divertido e pode levar anos até terminar e lançar. Respeito e admiro a atitude dele, mas vamos logo esclarecer que nessa situação isso não é negócio e sim diversão.
Mas se você é um desenvolvedor, quer abrir um estúdio, viver de criar jogos, bote na sua cabeça que terá que começar a pensar numa série de coisas como: modelo de negócios, planejamento, gestão de risco, soft skills e uma série de outras coisas que vão começar a impulsionar e alavancar o seu negócio. Sim, um estúdio é uma empresa privada, que precisa gerar receita para se manter, ou então gerar a justificativa da grana investida nela por um ou mais investidores.
Muitos estúdios hoje que estão no mercado vindos de desenvolvedores indies, que souberam expor suas ideias, apresentaram um plano de negócios realista. Eles mostraram como geram dinheiro com seu jogo e se apresentaram como uma empresa. Alguns destes estúdios, frutos de Startups, tiveram a visão de mudar sua ideia original para se adequar a um aporte de investimento e estão produzindo. (e mais importante: pagando as contas).
É importante você que quer começar a ter isso em mente para saber onde deseja ir, o que deseja fazer e aonde quer chegar. Terá que se sacrificar, desapegar e aprender a ouvir muitos “não” e críticas ao seu trabalho. This is the way…
Mas se você está achando que este papo é por demais capitalista, pessimista ou simplesmente rancoroso, fazer jogos como negócio não é para você. Faça por diversão e sem um compromisso com prazos, faça por satisfação pessoal. Acho importante ter essa visão e ter total consciência sobre ela. Acho que você será muito mais feliz.
Agora se seu jogo é um negócio está na hora de começar a mudar suas ações, traçar estratégias, estudar o mercado, suas tendências e como ele está se vendo as chamadas novas oportunidades. É importante ter esta mudança de pensamento, deixar de ser um pouco romântico e começar a ser mais profissional. A ideia por enquanto é gerarmos discussão e reflexão, para que possamos mostrar uma visão mais empresarial do desenvolvimento de jogos.
Texto enviado por Tony Garcia